quinta-feira, 9 de junho de 2022

António José Pimenta Ribeiro, um poeta do rio Vez

 

Não conheci o dr Ribeiro,  ( 01.04.1901 - 06.09.1974), como os seus alunos e conhecidos se lhe referem.

Adquiri na Casa das Artes, em Arcos de Valdevez, o seu livro de poesia, Obra poética, com Antelóquio doutro poeta arcuense, António Cacho.

O livro está dividido em 4 partes, PRIMEIROS ACORDES, ARRANJOS, MOVIMENTOS PERPÉTUOS, e VARIAÇÕES, num total de 188 páginas, edição da Câmara M. de Arcos de Valdevez, 2002

O autor foi médico, professor, jornalista e poeta! 

Deixo aqui alguns poemas, que de alguma forma me tocaram pela harmonia ou desarmonia social poética!

Só no final da sua leitura sugestiva, descobri que a capa era doutro escritor famoso, Valter Hugo Mãe!

Boas leituras!











sábado, 28 de maio de 2022

O livro

Desafiaram me a escrever sobre um livro de que tenha gostado muito. Escrevi este texto


 
O livro
 


Nunca soube porque ela me deixou o livro na mesinha de cabeceira, sem um recado, sem um adeus. Deixou-me, deitado na cama, foi-se embora e nunca mais voltou. Dela ficou apenas o livro, Não me mates porque não sou tua, de M.Wheels,Amazon.com,2000.
O livro ficou muito tempo arrumado na secretária, naquela prateleira dos livros a ler, mas que tardam em ser lidos.
Só anos mais tarde, quando soube do acidente de carro que a colocou numa cadeira de rodas me lembrei do livro...em cima da mesa de cabeceira. Fui à estante, sentei-me e nunca mais parei à procura do final, ou à procura do enigma que nós éramos.
A história podia resumir-se muito brevemente: numa cidade satélite duma grande capital europeia, vivia um casal, ele professor e ela médica. Faziam uma vida tranquila e reservada, sem muitos amigos, dedicados às suas exigentes profissões. Nos tempos livres faziam pequenas saídas e no verão visitavam outros países. 
Um dia acolheram, provisoriamente, uma colega de escola de Julian e rapidamente se percebeu que entre ela e Linda, se originou uma cumplicidade, que progressivamente se traduziu numa relação amorosa
A exigência profissional da vida na escola e algum arrefecimento da relação criaram uma névoa de distração a Julian, que quando se apercebeu do que se passava, mesmo à sua frente, já o incêndio transbordava o seu conteúdo num continente perdido.
Julian ainda tentou que com a saída da colega de sua casa, a relação pudesse voltar à tranquilidade anterior, mas o mal estava feito e os danos eram irreparáveis.
O autor alonga-se na descrição de diálogos surdos entre os dois, numa mistura de despeito e sombra, amor e luz, verdade e raiva, ou pela ordem inversa, despeito e amor, sombra e raiva, verdade e luz. 
Ao longo dos vários capítulos o leitor sente-se atraído pelo desenrolar dos acontecimentos, umas vezes deixa-nos soltos a divagar para, logo de seguida, nos agarrar pelo braço e levar-nos, à força, por novos caminhos e veredas insuspeitos.
 As descrições e analogias entre a sensualidade e os odores culinários são irresistíveis, a desenhar sorrisos cúmplices de água na boca e suores no corpo.
 
Quando acabei a sua leitura, revi toda a nossa relação e, finalmente, pude entender porque a amiga solteira de minha esposa nunca respondeu aos meus olhares e sorrisos, vendeu a casa por baixo preço e conduzia o automóvel no dia do trágico acidente em que morreu e condenou a uma cadeira de rodas aquela que durante tanto tempo foi minha companheira.
 
Manuel Rodas 
Oeiras, 26 maio 2022














  

  

segunda-feira, 23 de maio de 2022

a pera

 





Gosto de alguns objetos, pela sua funcionalidade, pela sua graça, por muitas razões, livros, computador,  impressora, máquina fotográfica, tesoura, alicate, faca, cana de pesca, lupa, sei lá... esquentador, máquina de café, telemóvel.... mas identificar-me com algum deles? Não. Algum deles pode devolver-me a imagem do que eu sou? Não! São estéticos, funcionais, utilizo-os, contam algumas histórias que vivenciei, mas pouco mais que isso.

Os objetos nunca fizeram parte da minha personalidade, nunca foram um objetivo ou um fim. 

Os objetos e o dinheiro foram sempre um meio...para fazer ou obter outras coisas, mais importantes e significativas.

Como sou de origem camponesa os objetos ou eram feitos por nós, ou comprados, mas todos tinham alguma utilidade, ou funcionalidade. 

Lembro-me dum relógio de sala dos meus pais, dum aparador na sala, um fogão de ferro na cozinha, um rádio, o telefone, que satisfaziam necessidades e eram significantes de progresso na vida, conforto e bem estar. 

Lembro-me também das toalhas de minha mãe, dos anéis e gargantilhas, travessões e brincos em ouro. Dos pratos, travessas e talheres que só eram usados em dia de festa! ( e como eram poucos os dias de festa!) Não eram a primeira prioridade, mas sugeriam um progresso na luta pela sobrevivência.

Algumas pessoas fazem coleção de canetas, isqueiros, pentes, canecas, relógios, etc... Eu nunca quis colecionar objetos; aliás, nunca quis colecionar nada!

Mas como tinha esta necessidade imediata de descrever um objeto significativo e com memória, fui procurar qual o objeto mais antigo que teimava em guardar e resistia a todos os embarques, mudanças e outras tragédias.

Em princípio, o tempo seria uma medida de importância... (pelo menos para quem mudou tantas vezes de casa). Qual seria? Procurei, (onde primeiro procurar, senão na memória?) procurei e ... voilá, encontrei uma “coisa” pequena, a caber na palma da mão, em tamanho e forma de pera, de madeira trabalhada, com um botão de marfim.

Onde me leva esta “pera”?

 

Tinha 14, 15 anos e corriam os últimos anos de 60. 

O colégio, em Ponte de Lima, estava instalado no palacete Villa Moraes, mandado construir no princípio do séc. XX por João Francisco Rodrigues de Morais (1851-1936) e constituía uma réplica do palácio do irmão Miguel Rodrigues de Morais, em Salvador da Baía.  Foi comprada pelo Cónego Manuel José Barbosa Correia, à filha e aos netos do fundador do Palacete (Noémia, e seus filhos Teresa Maria, Rosa Maria e Duarte Belfort Cerqueira Rodrigues de Morais, residentes em Lisboa, em 1960, por cerca de 1500 contos.  Foi integrado, mais tarde, na Misericórdia, em 1978 ( Limiana, Ano VI, nº 28, Junho 2012).

O exterior era composto por um grande jardim e uma quinta - à qual os alunos não tinham acesso. No jardim, existia, ainda, uma gruta artificial, com um lago também artificial. Havia mais dois lagos espalhados pelo jardim, resguardado da rua por grades de ferro e dois mirantes em cada esquina, com escadas e janelas em ferro forjado. As grades resguardavam o jardim do exteriro e impediam os alunos de fugirem.

O palacete tinha uma porta principal imponente e logo à esquerda um salão, ricamente decorado e com um piano, que ninguém tocava, o que acentuava a tristeza da sala e dos dias. À direita, era a secretaria e, em frente, um grande corredor. Do lado direito, a capela, e à esquerda, a sala de refeições. No interior havia mais salas e a cozinha, onde nunca fui. O corredor terminava numa porta, que dava acesso ao jardim, através dumas escadas. À direita, havia mais duas salas.

Para os andares superiores, uma longa escadaria com corrimão de madeira. No andar de cima eram as salas de aula e no último andar, as camaratas e os quartos de dormir.

As paredes e tetos das salas de aula e do refeitório eram ornamentadas com desenhos e pinturas (arte nova?), mas as carteiras e armários e a violência do diretor, Padre Lopes ( com o seu chicote de fios elétricos entrelaçados) contrastavam, impunemente, no meu dia a dia de adolescente.

A capela e a sala da música eram as salas de maior luxo e fausto, pois além das paredes ornamentadas possuíam ainda mobiliário condicente com a antiga função de palacete!

Algures no sótão, para onde gostava de ir (ocasionalmente), ainda se encontravam restos dessa antiga vida, de sabor a sertão brasileiro.  Foi aí que encontrei a minha “pera” e ... fiquei com ela até hoje!

Porquê?- interrogo-me agora ( e não sei a resposta).

Provavelmente pela beleza da peça, em madeira trabalhada, pela elegância das formas, pela evocação dum tempo em que os senhores chamavam os criados. Era um interruptor de madeira, eletrificado, com botão em marfim.

Aquela “pera” sugeria-me o tempo dos nobres e reis, e ... dos criados. Esse mundo que só conhecia dalgumas leituras e filmes. Ainda hoje gosto de filmes de cavaleiros  e espadachins!

A peça era um interruptor para chamar alguém (eu sabia que nunca me viriam salvar...) Eu queria chamar, pedir socorro, fugir dali, a minha grande experiência de tortura, horror e medo! 

 

O tempo passou, lá resisti - o melhor que pude e sabia - saí do colégio com 16 anos, com ideias erradas da amizade, do poder, submissão e violência, da educação, enfim, da vida! Em contrapartida, sabia a história dos romanos, dos gregos, do renascimento, das descobertas, das guerras mundiais, das superpotências, inglês e francês... e, sem saber que gostava de ler e escrever! Sabia ser esquivo, atento às mínimas alterações do clima social, aparentemente indolente, sem curiosidade, sem crença, nem fé! Mais tarde, graças aos camaradas da minha aldeia, recuperei a esperança num mundo melhor, na liberdade, verdade, justiça e solidariedade... Comecei a descobrir o mundo já tarde (o mundo também me tinha ignorado)!

Acabados os estudos básicos, fui para o Liceu de Braga e levei o interruptor comigo. Acompanhou-me este tempo todo... até hoje, tantos anos depois! 

A pera resistiu à implantação da república, ao fascismo, ao padre Lopes, à guerra colonial, ao 25 de abril, à UE, à NATO e vai resistir à guerra da Ucrânia. 

Como lâmpada de Ladino, eu sopro, esfrego, carrego no botão, mas ninguém responde, ninguém me vem dizer que a guerra acabou e a paz está iminente. Bem olho, rodo e rodopio, manuseio e sinto, mas...nada!

No verão passado, num almoço com antigos colegas, alguém informou que havia um projeto dum museu na Villa Moraes, em Ponte de Lima.

 

Pronto, pensei comigo, vai ser agora que vou restituir a minha “pera”! Talvez instalada no velho palacete, possa, finalmente reconstituída a unidade ancestral, desvendar o génio que transporta em si. E fico a imaginar a srª D. Noémia Morais, de vestido rendado até aos pés, de leque na mão esquerda, enquanto na direita, a “pera” reluz na incomodidade subserviente da criada, no seu quarto, onde estava já prestes a descansar!

 



Manuel Rodas

quinta-feira, 19 de maio de 2022

Os meus livros

 

Vários amigos têm perguntado onde podem encontrar os meus livros.

Digo-lhes que os podem encontrar na Amazon. Para a Europa  Amazon.es, é a mais barata, mas mesmo assim, aconselho a compararem os preços, pois estes variam de país para país! 

Os livros em formato digital são mais baratos e podem ser descarregados nos tabletes ou telemóveis, obrigando a descarregar a Aplicação de leitura.

Como não tenho editora, nem rede de distribuição que faça campanhas publicitárias, agradeço que, se gostarem, os aconselhem aos amigos e os ofereçam, quando acharem conveniente, aniversários, momentos especiais, etc.

A todos o meu muito obrigado!

Manuel Rodas

Eis o link

https://www.amazon.es/gp/buy/thankyou/handlers/display.html?purchaseId=404-7180512-5291540&ref_=chk_typ_browserRefresh&isRefresh=1


terça-feira, 17 de maio de 2022

Pontapé

 





Pontapé
Ah, se a poesia desse um pontapé
nos obstáculos do porvir
e abrisse caminho ao que é
e em todos e cada um faz sorrir
Ah, se a poesia tivesse gente
que fosse daqui ao longe, além
onde a razão é coisa que se sente
é aventura, destino, amor também!

Se o poema para ser único e verdadeiro
sangrasse no peito, incólume, sem desdém
no altar, a verdade exaltada, sem madeiro

corresse na noite a iluminar os vizinhos
marias vestidas de negro, santos, amém
ateando a liberdade em todos os caminhos.


MRodas

domingo, 1 de maio de 2022

Dia da mãe

 

Flores para ti, mãe

Que do teu sorriso se desprenderam


Foram flores 

Que no meu peito nasceram!

domingo, 24 de abril de 2022

As flores de abril

 


No longo inverno de Portugal

As flores eram apenas flores

Umas grandes e outras pequenas

Umas  a preto e branco, outras desmaiadas

Mas todas tristes, apenas flores tristes!


As flores de abril raiaram de verde e vermelho

Saíram à rua e na rua ficaram 

Por muitas esquinas e praças, campos e chão!

Davam cores, cheiro é sonho

E do que recebiam, nunca diziam, não!


Uma criança que a tudo assistia, pensou

Quando for grande quero pintar flores.

Quando voltou a fome e guerra

E o medo saiu à rua

O menino, já homem, pintava flores

Apenas flores e sempre flores, 

As belas e excêntricas flores de sempre! 


O que ele nunca pintou 

Foram papoilas e cravos 

Porque tinham sido todos requisitados 

Para as comemorações e demais ovações

Homenagens, discursos e recordações!


Manuel Rodas









sexta-feira, 25 de março de 2022

Adeus, Costa, meu primo, meu irmão!

 Ler em voz alta com música de fundo

https://youtu.be/0T7uxAbg9l0


Adeus, Costa


adeus, adeus, adeus

nunca mais sentirei o teu olhar no meu abraço

no mais profundo da humanidade de cada um

nunca, nunca mais

nunca mais beberei contigo na frescura do Corgo

nunca, nunca mais

nunca mais acenderemos o cigarro na noite, ao luar

nunca, nunca mais

nunca mais nadaremos o rio da Várzea

nunca, nunca mais

nunca mais assaremos o rojão na lareira

nem cozinharemos o bolo da pedra

nunca, nunca mais

nunca mais me contarás as aventuras em França

nunca, nunca mais

nunca mais me dirás os segredos do porco bravo

nunca, nunca mais

nunca mais teus olhos azuis chorarão

a dor da separação e da resignação.


Adeus Costa

adeus, adeus, adeus.


Fico com minha dívida por pagar

sem te poder dizer

- como foi possível nunca te ter dito?-

como me soubeste dizer e fazer sentir

que contigo, em Passárgada

o rei era meu amigo

e podia fazer tudo o que quisesse.

Adeus, Costa

adeus, adeus, adeus


Manuel Rodas

25 março 2022




sexta-feira, 11 de março de 2022

Agora mesmo

 Agora mesmo




O frio era muito antigo

Vinha de longe com a mesma mensagem

A mesma roupagem fria, nua, intensa

 A dissecar todas as partículas do pensamento

atirando ao ar cada emoção

E ao caírem 

são laminadas em hóstias hostis

Com golpes horizontais, luminosos de azul e branco


Bailavam os fragmentos em ondas elípticas

Arrastando o pensamentos e a alma

Cheios de frio


Nesse dia 

O poeta enfrentou a guerra

O general, a paz

O padre, o céu

E o sofrimento abraçou o moribundo

Com promessas de esperança!


Manuel Rodas

domingo, 20 de fevereiro de 2022

Marcas que o tempo deixa

 Elvas, ao final do dia, as marcas do tempo lembram o caminho feito e não esquecem o que falta fazer!









quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Setubal

 







 

1- Ponto de partida

Há já alguns anos que visito Setúbal. Gosto da sua gente, das ruas e dos barcos com seus pescadores e todos os que em volta das ondas navegam.

Mas, por imperativos vários, sempre voltava a casa no mesmo dia, aumentando a gminha consciência de que para sentir um lugar é preciso dormir nele.

Desta vez, dormi três noites em Setúbal.

Durante o dia visitei vários locais, tendo começado pelo edifício da Câmara Municipal, o largo defronte, no Largo de Bocage!

O sítio transpira calma e um certo apaziguamento. Será das gentes? Será das consequências do Covid? 

Dali, segui para o Posto de Turismo, belamente decorado e com um bar no terraço, sobranceiro à praça, onde saboreei um delicioso café, sob o olhar atento do sol, que me envolvia com o seu tradicional calor duma manhã diferente de fevereiro!

Impossível visitar esta terra e não caminhar ao longo da Av. Luísa Todi, uma avenida verde e pujante de vida e arte!

O tempo corre, mesmo em férias, ou sobretudo, em férias. Uns choquinhos bem grelhados, bem regados, sob o olhar atencioso da empregada ( cabelos pretos e lisos, orientais, ou mais uma imigrante brasileira...) e ala até à beira mar, apanhar sol,  beber um café e consultar as notícias no tablet,  no Press Reader!

Voltamos ao Mosteiro de Jesus, na rua Acácio Barradas e as semelhanças com os Jerónimos são por demais evidentes. Soubemos mais tarde, que o convento se situa na passagem do gótico para o renascimento manuelino, tendo sido desenhado por Diogo Boitaca, em  1495, por desejo e ordem de Justa Pereira Rodrigues, ama de D. Manuel I.

O monumento, em fase de recuperação- pelo que, apenas, podemos visitar a nave central da capela mor- está despido de ornamentações e estatuária, de momento preservadas até final das obras.

O teto é suportado por colunas torças, ou torcidas feitas com pedras da Arrábida, acrescentando-lhe uma leveza e originalidade peculiares. As paredes laterais são revestidas de azulejos descrevendo cenas religiosas. Como curiosidade, fica a nota de que foi aqui rectificado o  Tratado de Tordesilhas, por D.JoaoII, dividindo as descoberto do novo mundo com a Espanha. Admirável terra, que a tudo assistiu e deu aval ao primeiro tratado global da história da humanidade!

Neste périplo, acabamos a tarde, na Casa da Baía, mais que um posto de turismo, é um espaço de divulgação dos bens desta terra e onde se pode lanchar, petiscar,alongar as pernas e saborear um delicioso licor!

Nas suas costas, o Bairro do Troino, um bairro com origem nos pescadores, mas parece que já no tempo dos romanos se fazia por aqui a salga de peixe! Lugar de destaque à mercearia Confiança, ricamente preservada pela câmara municipal e pelos herdeiros, a lembrar as mercearias deste país desde os séculos passados.

Era obrigatório passar no mercado do Livramento, que existe desde 1876, mas o edifício Art Déco é de 1930 e destaca-se pelos painéis de azulejos do interior, com cenas do quotidiano setubalense como o cuidar das redes, a salga do peixe, o transporte do sal ou a vindima. Salienta-se as cores dos frutos e legumes,  brilho dos peixes e a azáfama de quem lá trabalha.

Bem pertinho da Igreja de São Sebastião, na Rua Edmond Bartissol, n.º 12, encontra-se o espaço museológico Casa Bocage, o local onde nasceu o polémico poeta português. Vale a pena a visita para saber mais da vida e obra do Bocage. Não há outra terra onde um poeta esteja tão presente na vida da cidade, como esta. São ruas, largos, casas comerciais, em todo o lado, lá está Bocage, concerteza a sorrir por boas e memórias e outras de escarnecer, ou rir!

O mesmo preito é oferecido a Luísa Todi. Em estátuas, referências e nomes de rua e praça é outra presença constante a disputar a atenção com o poeta!

Não vou falar do Forte de S. Filipe, do Museu do Trabalho, nem no Miradouro de S. Sebastião, porque os tinha visitado anteriormente. 

Aqui, ainda muitos se lembram da importância da industria conserveira. Ainda andam no ar os gritos de chegado do peixe e o barulho das corridas das mulheres nas ruas, a correr para as fábricas, onde só havia trabalho quando havia peixe, trabalho que podia durar 12, 14 ou 16 horas. O tempo era determinado pela existência do peixe e a necessidade de sobreviver. Até que o 25 de abril pôs fim a este calvário.

Desapareceram as conserveiras, os soldadores das latas, os batedores, os "mexilhões" e os carregadores, de cestos à cabeça.

Numa próxima vez prometo visitar o parque do Bonfim e o aqueduto de Setúbal, sempre com bom peixe ao almoço e boa companhia ao jantar e ceia.

Venho embora com o sentimento de ter estado com gente amiga, uns familiares distantes e alguns soajeiros que para aqui migraram nos anos 30 e 40 do século passado. A todos procurei, nas ruas, jardins e padarias. A todos deixo a promessa de voltar mais vezes e, quem sabe, visitar os amigos, fazer amizades novas a acrescentar às atuais, em próximas crónicas. 

Manuel Rodas