(Maria, agora um pouco mais velha, está sentada numa cadeira de balanço, as mãos marcadas pelo tempo e pelo trabalho, acariciando um pedaço de tecido gasto. A luz fraca da tarde projeta sombras longas no seu rosto, realçando as linhas de sofrimento e as marcas de resiliência. A sua voz é rouca, mas carregada de emoção e determinação.)
"Lembro-me do cheiro do sabão em pó, sempre presente na minha vida... um cheiro que se misturava com o suor, com as lágrimas, com o medo. Na lavandaria, as roupas vinham sujas de tudo: lama, vinho, amor e ódio. E eu, a Maria, lavava tudo, como se pudesse lavar também a dor que trazia dentro de mim. Cada peça era um pedaço da vida de alguém, mas nenhuma refletia a minha. Nenhuma refletia a batalha que eu travava todos os dias, a luta silenciosa contra os demônios do meu passado.
O tio... ele dizia que era um segredo, que ninguém podia saber. E eu, tão pequena, acreditei. Acreditava em tudo o que me diziam, porque era uma menina boa. Mas a bondade não me salvou dos seus toques, dos seus beijos nojentos, daquela sensação de que o meu corpo era um campo aberto para a sua perversão. Maldito...
(Silêncio pesado e frio)
A escola... oh, a escola... era um lugar onde eu me sentia ainda mais perdida, ainda mais pequena. As letras, os números, as palavras... tudo parecia tão distante, tão incompreensível. A minha cabeça não acompanhava o ritmo, a minha mente voava para outros mundos, para outros sonhos.
Lembro-me da professora, uma mulher fria e distante, com um olhar que me fazia encolher. Ela dizia que eu era burra, que não tinha jeito para aprender, que era um caso perdido. As suas palavras eram como chicotes que me vergastavam a alma, que me faziam sentir inferior, incapaz.
E eu acreditava nela. Acreditava que era burra, que não tinha valor, que nunca seria ninguém na vida. A baixa auto-estima instalou-se como um inquilino indesejado, a corroer a minha confiança, a diminuir a minha esperança. Eu via-me como um erro, como um fracasso, como uma pessoa que não merecia ser feliz.
As outras crianças riam de mim, zombavam dos meus erros, dos meus tropeços, das minhas dificuldades. E eu, em vez de reagir, em vez de me defender, calava-me, fugia para o meu mundo imaginário. Um mundo onde eu era uma princesa, uma heroína, uma aventureira, uma mulher livre e poderosa.
No meu mundo de fantasia, eu voava pelos céus, navegava pelos mares, explorava as selvas, lutava contra os monstros, salvava o mundo. No meu mundo, eu era amada, era admirada, valorizada. Mas depois, a realidade voltava a atacar, como um balde de água fria. E aquela mão fria e escura voltava a me arrastar para o fundo do poço.
As notas baixas, as reprovações, as repreensões... tudo isso só reforçava a ideia de que eu não era boa o suficiente. A escola foi sempre um lugar de tortura, um local onde os meus sonhos eram pisados, onde as minhas esperanças eram destruídas. E eu, cada vez mais, me sentia alienada, isolada, desamparada.
As outras crianças e, mais tarde, os colegas do liceu, iam para a escola com alegria, com entusiasmo, com a ânsia de aprender. Eu ia com medo, com receio, com a certeza de que mais um dia seria de humilhação. E cada dia era como uma batalha perdida, uma prova de que eu era realmente burra, realmente incapaz.
E assim, a minha vida escolar passou, como uma sombra, sem deixar marcas positivas. Não gostava de escrever e de calcular. Apenas gostava de ler. Não aprendi a confiar em mim mesma, a acreditar nas minhas capacidades, a lutar pelos meus direitos. E a baixa autoestima, esse fantasma, seguiu-me para a vida adulta, impedindo-me de realizar todo o meu potencial, de conquistar os meus sonhos.
A fantasia, essa fuga, foi a minha salvação, a minha arma, o meu refúgio. Mas ao mesmo tempo, foi a minha prisão, o meu limite, a minha dificuldade em enfrentar a realidade. Eu vivia em dois mundos, e não me sentia pertencente a nenhum. A escola não me preparou para a vida, ela apenas me ensinou a sentir vergonha de quem eu era, a esconder-me, a contentar-me com o mínimo.
E hoje, olho para trás e vejo o desperdício, a injustiça, a crueldade. Vejo que não era burra, que não era incapaz, que apenas fui silenciada, diminuída, desqualificada. E sinto uma raiva profunda, uma revolta contra aqueles que me roubaram a oportunidade de aprender, de crescer, de florescer. Aqueles que tinham obrigação de me ajudar e apoiar.
A escola deve ser um lugar de oportunidades, de crescimento e não um lugar de opressão, de humilhação, de desqualificação.
(Maria levanta a cabeça, o olhar agora mais firme, como se estivesse a declarar guerra contra o sistema que a oprimiu. O seu monólogo é agora uma denúncia da injustiça educacional e um apelo à ação para que todas as pessoas tenham a oportunidade de realizar todo o seu potencial.)
E depois, vieram os casamentos. Dois homens que me prometeram o céu, mas deram-me o inferno.
Os maridos... eles nunca foram capazes de amar. Eles não sabiam o que era o amor, eles só sabiam o que era a posse, o domínio, o controle. E eu, a cada dia, a cada humilhação, a cada violência, sentia o meu amor a transformar-se em despeito, em raiva, em ódio. Um ódio que me corroía por dentro, que me fazia querer gritar, fugir.
O primeiro, com a sua frieza, com os seus punhos, com o seu silêncio. Ele reduzia-me a nada, a um fantasma. Eu era a empregada, a criada, a mulher que tinha de fazer tudo, e ainda assim, não era o suficiente. E depois, o segundo, com a sua falsa gentileza, com o seu sorriso traiçoeiro, com a sua sede de poder. Ele humilhava-me com palavras, com olhares, com desprezo. Era um torturador de almas, um vampiro que sugava toda a minha energia.
E eu? Eu sentia o ódio a crescer em mim. Um ódio amargo, um ódio sufocante, um ódio que me fazia querer a vingança. Tantas vezes imaginei matá-los, esfaqueá-los enquanto dormiam, ver o seu sangue escorrer pelo chão... mas não era capaz. O meu ódio era grande, mas a minha moral era maior. Eu não queria me transformar num monstro como eles.
Mas o despeito... ah, esse ficou. O despeito por ter sido enganada, por ter sido usada, por ter sido desvalorizada. O despeito por não ter tido a vida que eu merecia, o amor que sonhava, a felicidade que ansiava. E esse despeito se transformava em frustração. A frustração de não poder mudar a minha vida, de não poder sair daquela prisão. A frustração de ter de sorrir quando queria chorar, de ter de calar quando queria gritar.
E tudo isso se acumulava dentro de mim, como lava vulcânica prestes a explodir. As minhas noites eram de insónia, os meus dias de angústia, e a minha alma de escuridão. E eu perguntava, tantas vezes, porquê? Porquê eu? Porque tinha de suportar tanta dor? E a resposta, era sempre a mesma: por ser mulher. Por ser mulher num mundo dominado por homens que nos veem como objetos, que nos tratam como escravas, que nos negam o direito à felicidade.
Os filhos, um rapaz do primeiro casamento e duas meninas do segundo, foram a única luz no meio de tanta escuridão. Mas mesmo eles, cresceram vendo o meu sofrimento. Cresceram ouvindo as discussões, as ameaças, os choros. Tentei protegê-los, mas o medo também se tornou parte da nossa vida. A lavandaria era o meu refúgio e ao mesmo tempo, a minha prisão. O trabalho era incessante, o corpo doía, mas era a única maneira de sustentar a casa, os filhos, a esperança de um futuro melhor.
E o que via eu refletido no espelho? Uma mulher cansada, marcada, mas teimosa. Os olhos perderam o brilho da juventude, mas não perderam a capacidade de ver a injustiça, de sentir a revolta. A revolta contra o silêncio, contra a indiferença, contra a passividade.
Quantas vezes quis gritar? Quantas vezes quis correr? Quantas vezes quis simplesmente desaparecer? Mas eu não podia. Não podia deixar os meus filhos, não podia deixar a minha voz ser silenciada. Aquele pedaço de tecido que tanto acaricio... era o meu escudo, a minha arma, o símbolo da minha luta.
Porque eu não sou só a Maria da lavandaria. Eu sou a Maria que sobreviveu. A Maria que aprendeu a levantar a cabeça depois de cada queda. A Maria que decidiu que a sua dor não seria em vão.
(Silêncio)
Ah, o amor... que palavra traidora! Tantas vezes ouvi essa palavra, tantas vezes acreditei nela, e tantas vezes fui enganada. Na minha juventude, havia um rapaz... um rapaz com os olhos brilhantes, com um sorriso que me fazia sonhar. Ele tocava viola e cantava canções de amor... canções que eu guardava no coração. Mas o destino, esse cão sarnento, tinha outros planos para mim. Casaram-me com outro, um homem que não me via, nem ouvia, que nem me sentia. O meu coração ficou em pedaços, as canções silenciaram-se, e a minha juventude foi roubada.
Aquele amor... aquele amor reprimido... ele nunca morreu. Ficou ali, como uma ferida aberta, a latejar em cada dia, em cada noite. Quantas vezes fiquei a olhar para as estrelas, a lembrar-me do seu rosto, a desejar um toque, um abraço, um beijo que nunca chegou. E depois, a realidade... a cama fria, o corpo do marido ao meu lado, o vazio que crescia como erva daninha no meu peito.
Mas hoje, eu olho para trás e vejo que o meu ódio e o meu despeito não me destruíram. Eles fortaleceram-me, eles transformaram-me numa mulher que não se cala, que não se rende, que não se acobarda. Porque eu sou mais forte do que o meu sofrimento, mais valiosa do que as minhas lágrimas, e mais digna do que todos os homens que me tentaram destruir.
(Maria fecha os olhos, uma lágrima escorre pelo seu rosto, mas o seu rosto está carregado de uma determinação inabalável. O seu monólogo é agora um grito de fúria e de esperança, uma declaração de guerra contra a opressão.)
E por isso, eu vos digo, filhas, mulheres do mundo inteiro: não se deixem destruir! Não se deixem esmagar! Não permitam que vos transformem em meras peças de roupa suja que se lavam, se torcem e se atiram para um canto. Vocês são muito mais do que isso! Vocês são filhas, mães, irmãs, amigas, companheiras de luta. Vocês são a essência da vida, a força que move o mundo.
Não se contentem com as migalhas de amor, com as sobras de respeito. Exijam o que vos pertence por direito: dignidade, igualdade, liberdade. Não permitam que vos digam que são fracas, que são menos inteligentes, que são menos capazes. Não acreditem nas mentiras que vos contam há séculos.
O nosso corpo é o nosso templo, a nossa voz é a nossa arma, e o nosso coração é a nossa bússola. Não tenham medo de mostrar quem são, de expressar os vossos sonhos, de lutar pelos vossos direitos. Não se calem, não se escondam. Juntem as vossas vozes, ergam as vossas cabeças, e mostrem ao mundo a força que reside em cada uma de vocês!
Porque juntas, nós somos mais fortes. Juntas, nós somos invencíveis. Juntas, nós vamos mudar o mundo."
(Maria respira fundo, o olhar fixo num ponto distante, como se estivesse a ver o futuro que ela sonha. As suas mãos apertam o tecido, como se estivessem a agarrar a esperança. Asmãos repousando no colo, os olhos fixos em algo distante, como se estivesse a observar o seu próprio corpo a desfazer-se. A sua voz agora é mais melancólica, quase um lamento, mas com resquícios de rebeldia.)
"O meu corpo... ah, o meu corpo... como ele mudou! Como ele sofreu! Quando eu era jovem, era um corpo cheio de vida, cheio de desejo. As minhas curvas eram suaves, a minha pele macia, e o meu olhar cheio de promessas. O desejo pulsava em mim, como a seiva nas árvores na primavera. Desejava ser amada, ser tocada, ser acarinhada. Desejava sentir a paixão, a entrega, a fusão de dois corpos numa só alma.
Eu vi o meu corpo a mudar, a transformar-se num reflexo da minha dor. As curvas foram desaparecendo, substituídas por cicatrizes. A minha pele perdeu a maciez, tornando-se áspera e marcada. Os meus olhos perderam o brilho, tornando-se tristes e cansados. O desejo, esse companheiro fiel, começou a morrer lentamente, como uma flor que se desfaz sob o peso do inverno.
Sentia a minha feminilidade a esvair-se a cada dia, como um balde cheio de furos. A minha menstruação, que antes era um sinal de fertilidade, passou a ser uma maldição, um lembrete da minha capacidade de gerar filhos que iriam herdar a minha dor. Os meus seios, que antes eram um símbolo da minha feminilidade, passaram a ser apenas um local onde os homens depositavam a sua lascívia.
E o meu ventre, ah, o meu ventre... esse gerou os meus filhos, mas também gerou a minha dor. Cada gravidez era um fardo, um risco, uma preocupação. Os meus filhos eram a minha alegria, mas também eram um testemunho da minha falta de liberdade. E depois de cada parto, o meu corpo ficava mais fraco, mais marcado, mais cansado.
E o desejo, esse fantasma, ia-se afastando cada vez mais. Quantas vezes eu quis sentir o prazer, o êxtase, a comunhão de almas num abraço de amor? Mas os toques dos meus maridos eram como farpas, como ferro em brasa, como um castigo. E o desejo foi morrendo, morrendo lentamente, até se transformar em nada.
A minha vulva, que antes era o centro do meu prazer, tornou-se um local de dor, de vergonha, de repulsa. E eu me vi como um objeto, um receptáculo, um lugar onde os homens depositavam as suas frustrações. Perdi o controle do meu corpo, perdi a minha identidade, perdi a minha ligação com a minha própria sexualidade.
E vi o meu corpo a envelhecer, a murchar, a desfazer-se lentamente. As rugas surgiram, como mapas das minhas dores. Os cabelos brancos cresceram, como testemunhas dos meus sofrimentos. Os meus ossos ficaram fracos, como se a minha vida estivesse a esgotar-se. E o desejo, esse espectro, tornou-se apenas uma lembrança, uma dor fantasmagórica, uma saudade de algo que nunca mais seria meu.
Mas hoje, olho para o meu corpo e vejo mais do que cicatrizes, mais do que rugas, mais do que cansaço. Vejo a força da sobrevivência, a resiliência da alma, a teimosia da vida. O meu corpo é um testemunho da minha história, das minhas lutas, das minhas vitórias. E mesmo que o desejo tenha morrido, a minha vontade de ser livre, de ser feliz, de ser amada, nunca morrerá.
(Maria está sentada, um sorriso terno surge nos seus lábios, os olhos agora refletindo uma luz suave, uma alegria serena. A sua voz, antes marcada pela dor e pela raiva, agora tem um tom mais doce, mais suave, cheio de esperança.)
Depois... depois de tanta dor, depois de tanto sofrimento, depois de tanta escuridão, a vida reservava-me uma surpresa. Uma surpresa inesperada, uma surpresa maravilhosa. Verdade! Uma surpresa maravilhosa.
Eu, que já tinha perdido a fé no amor, eu, que já tinha desistido de ser feliz, encontrei a Susana.
Ela vivia numa quinta, sozinha, cercada pela natureza, pelos animais, pelas flores. Ela era diferente de tudo o que eu já tinha conhecido. Os seus olhos eram azuis como o céu, o seu sorriso era quente como o sol, e o seu toque era suave como a brisa da manhã.
Ela não me julgou, não me criticou, não me humilhou. Viu-me, ouviu, e sentiu-me. Aceitou-me como eu era, com as minhas cicatrizes, as minhas rugas, as minhas dores. Ela amou-me com um amor verdadeiro, um amor puro, um amor que eu nunca tinha conhecido.
Com Susana, redescobri a ternura. As suas mãos acariciavam a minha pele como se fosse seda, os seus abraços envolviam-me como se fosse um cobertor. Ela dava-me atenção, paciência, ela importava-se com as minhas dores. Ela fazia sentir-me valorizada, amada, desejada.
Com Susana, eu redescobri a alegria. As nossas gargalhadas ecoavam pela quinta, os nossos passeios eram repletos de descobertas, as nossas noites eram de aconchego. Eu dançava, eu cantava, eu sonhava. Sentia a vida a fluir nas minhas veias, o meu coração a bater de novo.
Com Susana, redescobri o amor. Um amor que não era de posse, de domínio, de controle. Um amor que era de respeito, de liberdade, de igualdade. Um amor que me fazia sentir completa, realizada, feliz. Ela ensinou-me que o amor não tem género, não tem idade, não tem limites. O amor é uma energia, uma força, uma conexão entre duas almas que se encontram.
Com Susana, o meu corpo voltou a despertar, o meu desejo voltou a florescer. Os seus toques não eram como os dos homens, eram como carícias que me faziam sentir viva, que me faziam sentir mulher. Ela amava-me com delicadeza, com paixão, com entrega. E eu amava-a da mesma forma.
Na quinta, redescobri a minha ligação com a natureza, com a terra, com os animais. Eu cuidava do jardim, alimentava as galinhas, brincava com os cachorros. Sentia parte do mundo, parte da vida. E o medo, a tristeza, a dor foram dando lugar à esperança, à alegria, ao amor.
Com Susana, aprendi a amar-me e a aceitar-me, a perdoar. Aprendi que eu não era um erro, que não era um fracasso, que merecia ser feliz. Aprendi que o amor é a força mais poderosa do universo, capaz de curar todas as feridas, capaz de transformar todas as vidas.
E hoje, vivo na quinta, com Susana, cercada pela beleza da natureza, pela alegria da vida, pelo amor que nos une. Os meus dias são calmos, os meus sonhos são coloridos, o meu coração está em paz. Olho para trás e vejo que a minha vida não foi em vão, que a minha dor me trouxe até aqui, até este lugar de amor, de ternura, de esperança.
E com a Susana...aprendi a ver a vida com outros olhos. Ela ensinou-me a valorizar os pormenores, as pequenas coisas que antes passavam despercebidas. Ela ensinou-me a olhar para o céu, a contemplar as nuvens, a sorrir para as estrelas, a ouvir o canto dos pássaros, o murmúrio do vento, o silêncio da noite, a beleza que sempre ali esteve e não reparava.
Ela mostrou-me a beleza das flores, a delicadeza das pétalas, a força das raízes. Com ela aprendi a conversar com as flores, a sentir a sua energia, a partilhar os seus segredos, a abraçar as árvores, a sentir a sua força, a absorver a sua sabedoria, a acariciar os animais, a sentir o seu amor, a partilhar as suas vidas.
Com a Susana, eu intuí a integração no ciclo da natureza. O meu corpo dentia as estações a passarem, as folhas a caírem, as flores a nascerem, os frutos a amadurecerem. Eu era parte da terra, parte da água, parte do ar. Eu senti-me conectada a tudo o que me rodeava, a todos os seres vivos que compartilhavam o planeta comigo.
Aprendi a valorizar a minha respiração, a inspirar a vida, a expirar a dor, a meditar, a conectar-me com o meu interior, a encontrar a minha paz, a sentir a energia cósmica, a força que move o universo, o amor que une todas as coisas.
Com ela, aprendi a me sentir parte de um todo, parte da humanidade, parte do universo. Entendi que a minha dor, a minha alegria, a minha vida, não eram apenas minhas. Elas faziam parte de uma história maior, de um ciclo mais amplo, de uma dança cósmica que envolvia tudo e todos. Não estamos sozinhos, estamos todos conectados, somos todos um. O amor é a energia que nos une, a compaixão é a virtude que nos liberta, a gratidão é o sentimento que nos eleva. A vida é um presente, um milagre, uma oportunidade de amar, de crescer, de evoluir.
Aprendi a amar o meu corpo, a minha alma, o meu espírito, a valorizar as minhas cicatrizes, as minhas rugas, as minhas marcas. Elas não são sinais de fraqueza, mas sim de força, de resiliência, de sobrevivência. A beleza está na imperfeição, na singularidade, na autenticidade. Com ela, aprendi a sorrir, a sonhar, a amar, a confiar na vida, a acreditar na esperança, a celebrar a alegria, a viver o momento presente, a saborear cada instante, a apreciar cada detalhe. A felicidade não é um destino, mas sim uma jornada, uma escolha, um estado de ser.
(Maria está sentada, mas agora com a postura ereta, o olhar firme e desafiador. A sua voz não é mais suave ou hesitante, mas sim forte, com uma energia palpável. A sua transformação é visível, uma verdadeira leoa pronta para defender o seu território.)
"E então, quando pensava que a paz tinha chegado, a vida lançou mais um desafio. Os meus filhos, as minhas famílias, os meus ex-maridos... todos eles se uniram para me criticar, para me julgar, para me impedir de ser feliz. Eles não entendiam o meu amor por Susana, eles não aceitavam a minha nova vida, eles não queriam ver-me livre e realizada.
Os meus filhos, que eu tanto amei e protegi, olhavam-me com reprovação, com desprezo. Eles diziam que eu tinha enlouquecido, que tinha envergonhado a família, que estava a cometer um pecado. Os meus ex-maridos, que tanto me fizeram sofrer, que tanto me humilharam, sentiam-se com o direito de me ditar o que fazer, de me controlar, de me oprimir. Como se ainda fosse sua propriedade.
E as famílias, os amigos, os vizinhos... todos eles comentavam, todos eles criticavam, todos eles invejavam. As suas palavras eram como flechas, os seus olhares eram facas, os seus julgamentos eram pedras. Eles queriam arrancar-me do meu paraíso, eles queriam-me trazer de volta para o inferno.
Mas, desta vez, não me calei, não me escondi, não me acobardei. Desta vez, eu lutei. Lutei com todas as minhas forças, com toda a minha alma, com toda a minha garra. A leoa que estava adormecida dentro de mim despertou, e mostrou as suas garras, os seus dentes, a sua ferocidade.
Levantei-me, ergui a minha voz, mostrei a minha verdade. Eu disse aos meus filhos que o meu amor por Susana era verdadeiro, que a minha felicidade não dependia da sua aprovação, que a minha vida me pertencia. Disse aos meus ex-maridos que eles não tinham mais poder sobre mim, que eles não podiam mais ferir-me, que eu era uma mulher livre e dona do meu destino. Disse às famílias, aos amigos, aos vizinhos, que eles não tinham o direito de me julgar, que a minha vida era minha, que a minha felicidade não era da conta deles. Eu não aceitei as suas críticas, não me dobrei aos seus julgamentos, não me acobardei às suas ameaças. Defendi-me, protegi-me, lutei pelo meu direito de amar, de viver, de ser feliz.
Eu já não era mais a Maria que se calava, que se escondia, que se acobardava. Eu era outra mulher, mais afirmativa, mais confiante, mais decidida, mais lutadora. A dor, a humilhação, o sofrimento transformaram-me numa leoa, numa guerreira, numa defensora dos meus sonhos e da minha felicidade.
Enfrentei a oposição com coragem, com determinação, com convicção. Não me deixei abater pelas críticas, não me deixei intimidar pelas ameaças, não me deixei desanimar pelas dificuldades. E continuei a amar Susana, continuei a viver na quinta, continuei a ser feliz.
Os meus filhos, com o tempo, começaram a entender, começaram a aceitar, começaram a amar-me novamente. Os meus ex-maridos, desistiram de me controlar, de me oprimir, de me humilhar. E as famílias, os amigos, os vizinhos, aprenderam a respeitar, a admirar, a aceitar a minha nova vida. Os que não aceitam, não contam para mim. Estão mortos!
Porque a verdade, a coragem, a determinação são mais fortes do que a mentira, a cobardia, a passividade. E quando uma mulher decide lutar por si mesma, quando uma mulher decide defender o seu amor, quando uma mulher decide viver a sua verdade, nada a pode impedir.
E por isso, eu vos digo, mulheres: não se calem perante a oposição, não se acobardem perante a crítica, não se rendam perante a dificuldade. Lutem contra tudo e contra todos que queiram impedir-vos de serem livres, felizes e donas de vossas vidas. A nossa voz é a nossa arma, a nossa coragem é a nossa força, a nossa liberdade é o nosso destino. E juntas, vamos lutar por um mundo onde todas nós sejamos amadas, respeitadas, valorizadas e livres!
(Maria levanta-se, o olhar fixo no horizonte, como se estivesse a visualizar um futuro onde todas as mulheres são livres e felizes. O seu monólogo é agora um grito de guerra, uma proclamação da sua força, da sua coragem, e da sua vitória.
Maria sorri, as lágrimas escorrendo pelo seu rosto, mas agora são lágrimas de alegria, de gratidão, de amor. O seu monólogo termina com uma nota de esperança, uma celebração do poder transformador do amor.)
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