Padrão dos Descobrimentos
Quando
abri a porta mal podia supor que era um velho de fato e gravata, com chapéu na
mão. Reconheci-o de imediato e perguntei-lhe o que desejava. Sorriu com ar
gélido e disse:
- Queria
entregar-lhe o Padrão dos Decobrimentos, que mandei fazer em
1960, aquando das celebrações dos 500 anos da morte do Infante D. Henrique.
Fiquei
surpreendido, a olhar incrédulo, mas não o mandei entrar. Há muito tempo que o tinha colocado na
galeria das pessoas indesejáveis, ali entre as coisas e os animais.
Ele começou a falar, sem pedir autorização sobre o meu tempo.
Ele começou a falar, sem pedir autorização sobre o meu tempo.
Disse-me que pretendia evocar a expansão marítima portuguesa e por isso, tinha
a forma de uma caravela, bem alta com 50 metros de altura.
- Mandei
colocar bem na frente, a liderar o Infante D. Henrique. Queria que segurasse
numa mão uma pequena caravela! Mas claro, ele não é o único herói desta
historia. Por isso quis que os outros aparecessem em segundo plano, a Este e a
Oeste!
Comecei a
sentir um mal estar geral invadir-me. Estaria a sonhar? O que tinha eu a ver
com este velho e com o Padrão dos Descobrimentos?
- E porquê
neste local?- perguntei eu no intervalo da sua respiração ofehgante
- Bem… eu
só vinha entregar esta herança, não vinha dar explicações. Esse parece ser o
mal de muita gente. Quer explicações para tudo, sofrem dum mal infantil e ficam
toda a vida a perguntar porquê… mas enfim, queria um monumento à minha altura, em
Belém, mesmo na margem do rio Tejo, o nosso rio. Queria impressionar os
portugueses e todos os que nos visitassem. E já viu como impressiona à luz do
pôr-do-sol?
- E a
Rosa-dos-Ventos no chão?- perguntei eu, deixando-me entrar neste jogo.
-
Isso é outra história, mas fique sabendo que foi uma oferta da República da África
do Sul, toda esculpida em pedra, com um mapa central e figuras de galeões e
sereias desenhadas, mostrando as rotas das descobertas concretizadas nos
séculos XV e XVI.
- Se
aceitar a herança o que tenho de fazer com ela?
- Se
aceitar a herança posso partir em paz. Era um grande favor que me fazia.
Retirar-me para sempre e encontrar a paz que sempre desejei e nunca encontrei.
- E consegue partir em paz, apenas porque me oferece o monumento?
Arredondou o chapéu na cabeça, afagou a boca com a mão direita e olhando-me de frente, calou-se.
- Não acha que a herança que deixa é muito maior que o Padrão dos Descobrimentos? Só em sofrimento dava para fazer uma ponte daqui ao Brasil.
Ele continuava calado, sem pressa de partir, mas com vontade de chegar a um acordo. Resolvi ser mais razoável.
- E se trocar o Padrão pela Ponte sobre o Tejo? Quer pensar nisso?
Arredondou o chapéu na cabeça, afagou a boca com a mão direita e olhando-me de frente, calou-se.
- Não acha que a herança que deixa é muito maior que o Padrão dos Descobrimentos? Só em sofrimento dava para fazer uma ponte daqui ao Brasil.
Ele continuava calado, sem pressa de partir, mas com vontade de chegar a um acordo. Resolvi ser mais razoável.
- E se trocar o Padrão pela Ponte sobre o Tejo? Quer pensar nisso?
- Não são
coisas negociaveis. Venho dar-lhe o Padrão, não a ponte! Essa aliás já nem é
minha. É do 25 Abril. Aceita ou não?
- Tenho de
decidir já?
- Sim! É do
estilo de pegar ou largar...
- E promete
que não volta mais?
- Prometo.
- Dê cá o
Padrão e passe bem!
Ele deu meia
volta, não se despediu, mas enquanto acompanhava os seus passos, com os olhos,
ao longo do passeio, podia ver que se tinha empertigado mais um pouco e sem
olhar para trás, desapareceu na névoa dos meus sentidos.
Ainda
esbocei um gesto, tossiquei, mas ele já não voltou atrás. Ainda tinha uma ultima
pergunta, Porque só há uma mulher no Padrão? Era
tarde e eu tinha uma explicação - era inglesa!
E foi assim
que herdei o padrão dos Descobrimentos!
Manuel
Rodas, de Junho 2015
LADO OESTE
LADO ESTE
O padrão é um belo monumento, pois todas as fases de qualquer País produzem Arte e isso não impede que Salazar fosse um traste.
ResponderEliminarCom mais defeitos que qualidades, que também as tinha, ao permitir atrocidades infligidas pela PIDE coloca-o logo a ele e a quem o secundava conscientemente, na galeria dos inimigos do Povo português - uma opinião.
Verdade. Um grande traste, mas deixou-nos uma herança que não podemos recusar, censura, repressão, mesquinhez, sentimento de inferioridade, atraso cultural e cientifico, guerra, mortos, má memória...
Eliminar