quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Pintar a vida

 

Fotografia de Manuel Rodas, 2023

A minha busca pela pintura tem-me levado a caminhos desconhecidos, mas com fragrâncias e devaneios artísticos nunca antes experimentados. 

As primeiras vezes que comecei a escrever livremente - comecei na terceira classe - pude sentir o frémito do prazer de escrever, o coração acelera, a cabeça lateja, os sentidos expandem-se e a viagem por mundos desconhecidos começa. Quando alguém me repetia a apologia das drogas para acelerar o coração e sentir coisas  diferentes, eu ria-me, interiormente, porque podia sentir algo semelhante, desde que me predispusesse a escrever! 

Depois, voltei a sentir algo semelhante com a fotografia, mas aí, o momento, a ocasião, o instante, chamavam por mim e eu só reconhecia esse chamamento, mais tarde, sentado no computador, onde, então sim, redescobria o prazer da imagem! Algo semelhante acontecia com a escrita, quando no dia seguinte lia o que havia escrito na véspera e me surpreendia, perguntando-me se tinha mesmo sido eu o autor, ou então franzindo o sobrolho, remeter ao caixote do lixo a produção indigna.

O passo seguinte foi juntar essas duas descobertas e numa só, sintetizar algo, onde o resultado era mais que a soma das partes: juntar a imagem com a poesia! Mas tem sido a imagem sempre a chamar a poesia e raras vezes o contrário!

Ora aqui chegados convém explicar-me que, se na língua portuguesa tive mestres que me ajudaram a descobrir essa exaltação, também na fotografia encontrei amigos sábios que me apontaram o caminho e deixaram sinais para que eu os seguisse.

 O mesmo não aconteceu na pintura. 

É certo que há muitos anos vejo exposições, visito museus, sei da importância das artes na educação, convivi com grandes pedagogos, tenho amigos que pintam. Como professor sempre encontrei um espaço na sala para que os alunos pintassem, recortassem, colassem. Desde que a minha filha nasceu, sempre lhe dei  lápis de cores e papel e mais tarde, tinta, pincéis e um avental! Eu acreditava no poder reconstrutor e terapêutico da arte.

Mas no meu percurso de vida e de formação profissional, quer na idade de jovem, jovem adulto, quer em idade mais avançada como trabalhador-estudante nunca tive aulas, seminários, congressos, cursos de artes!

Mas o meu apreço pela arte, enquanto criador e não apenas como consumidor, já vem de longe! Recordo a minha mãe a admirar o talher de madeira, esculpido por um trabalhador. Os olhos a remirarem aa beleza do coração em ouro, que trazia ao peito.Lembro-me dum amigo, no Externato em Ponte de Lima, nos anos 60, ter escavado numa tábua uma máscara e um crucifixo.

Mais tarde, conheci a Angela C. em Viana do Castelo, nos anos 70,  que com um traço indelével desenhava uma cara, um corpo ou  parte dele, num movimento entre a dança e o espanto, que eu imaginava ser perante a vida e afinal era por descobrir algo, que sem ela não existiria.

A opção da minha filha pelas artes, na escola secundária e frequência da António Arroio, primeiro, Belas Artes, a seguir e, a ESAD, nas Caldas da Rainha, onde se licenciou, fez-me conviver e respirar as tintas e traços que nascendo na alma, viajavam pelo corpo e se exultavam pela mão, projectando-se no tempo e no espaço, ganhando vida independente do criador. 

A tudo isso assisti, quer da sua autoria, quer dos colegas e das suas exaltações quando falavam da sua arte e era nos seus olhos que os meus se incendiavam, mas sem coragem de me juntar a eles e arder também.

Foi preciso chegar aqui, aos 70 anos, para pegar no pincel e nas tintas e ...experimentar. 

Foi o Rui Lucas com os seus 80 e tal anos, que me desafiou a experimentar. Foi o Luís Costa que me cedeu o espaço/atelier, onde passo os melhores dias, os derradeiros. A todos, o meu muito obrigado.

São vocês, caros leitores e seguidores que, pelos vossos comentários, me motivarão a continuar a mostrar o que faço, porque continuar a pintar, lá isso irei, quer gostem, quer não gostem. Sei que não tendo formação específica para a função terei muitas dificuldades, mas não me posso impedir de  desenvolver um prazer tão grande como refazer o caminho da humanidade, que desde as pinturas rupestres até hoje, não desistiu de aproximar o céu da terra, o pó das galáxias aos desejos e emoções do coração da humanidade! 

Não sou artista plástico, sou apenas alguém que não vira costas a desafios, ainda que para isso me seja exigido revirar-me do avesso, ir por onde nunca fui, estar alerta para que nada se perca, e deixar fluir a vida, como ela sempre quis, em liberdade!

Deixo-vos aqui um exemplo das minhas últimas experiências e aguardo os vosso








 


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