segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Todos os nomes ( Aos autores com problemas de nomes para as suas personagens)


Os nomes

  

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Os nomes colam-se às pessoas para toda a vida. Herdam-nos no batismo e o tempo acrescenta outros nomes de família, características pessoais ou referência dum local com eles relacionado. Passados alguns anos, já na idade bem adulta, acresce o Ti, para homem e Tia, para mulher.
Por exemplo, em Paradela, havia as pessoas que só transportavam o seu nome: Ti Abílio Morgado, Ti José Rodas, Tia Adelina, Ti João Martins, Ti Lísia, Tia Delfina, Ti Pinheiro, Ti Guilhermino, Ti Manuel Rodas, Ti Firmino Martins, Ti Diogo, Ti Xico, Tia Marcelina, Ti Mário Correia, Tia Custódia, Ti Rego, Tia Mineira, Ti Casimiro Cachês, Ti Félix, Ti João Morgado, Tia Maria Martins, Ti Capela, Ti Zé Rego ,Ti Chaxo, Cabo Alves, Ti Manuel Canado, Ti Manuel Rodas, Ti Luís Guiço, Ti Moreira, Ti Prudêncio Lima, Germano Rodrigues, Adolfo Rodrigues, Ti Silvareira, Ti Fagulhas, Ti Rosa Lima, Ti António Martins, Tia Russa, Tone Russo, Albino, Fernando Palmiro, Manuel Palmiro, Ti João Palmiro, Tia Barqueira, Tia Rosa Rega, Manuel Curto, Tia Cidade, Ti Plaino, Tia Maria Plaina, Tia Filomena, Ti João Rodas, Tia Maria Curta e Tia Codeça.
Um segundo grupo de nomes de pessoas reúne aqueles que lhe acrescentavam características pessoais: Ti Joaquim, que por ser grande ficou, Joaquim Grande, uma alma grande e que desde cedo, por questionar a injustiça do mundo, se viu confrontado com as piores partes. 
Ao contrário, o Ti João Pequeno, que como se imagina era pequeno, de bigodinho e ar esperto como pardal; Ti João Palouco, por ser gordo como um palouco, ao contrário do  Xico Fininho, sempre sentado a beber e a fumar no Eiró; Ti Abílio Maneta, a quem faltava uma mão, mas nem por isso deixava de fazer uns socos que eram uma perfeição nos pés; Ti Marreco,  por deformidade física, óbvia;  Ti Arrobas, sempre a medir forças e habilidades, desafiando os outros para uma marcha acelerada ou a levantar, na posição vertical, uma cadeira ou banco apenas com uma mão e Ti António Mudo, que tão bem se entende, pois não falava. Ele falar, falava, com as mãos, com gestos, expressões faciais e com o olhar sempre triste e magoado. Se falasse o que diria quando se riam dele? Ou quando falavam, falavam para dizer que o trabalho dele valia menos que o dos outros? Ele não os ouvia, mas entendia a emoção que transmitiam quando falavam. Ele lia-lhes a alma e, às vezes, não era nada clara! Era ante sum poço findo cheio de escuridão e receios.
Um terceiro grupo herdava os nomes de terras ou locais relevantes para a sua história pessoal ou porque habitavam nesses locais: Ti Luís da Quelha, Ti Manel da Quelha, Ti Maria da Quelha, todos moradores num quelho estreito, que na fala se tornou feminino, Quelha. Ti Domingos do Regueiro, Ti Rosa do Regueiro, a quem o nome reproduzia uma imagem mental que os situava numa zona de todos conhecida, a zona da fonte, onde a água, a escorrer pelo caminho, secava no verão a ceder espaço à pequena Fonte da Sapa.
 A Ti Rosa do Campo e sua filha Ti Maria do Campo, que todos sabiam serem do Campo Grande, mas por economia do esforço ficava apenas Campo, embora campos era o que mais havia por ali. Ti Maria das Lages, que por morar num sítio todo ele feito de fragas e lages, se lhe colou ao nome e lhe deu cabo dos joelhos a transportar os cestos de espigas, uvas e erva ou couves desde lá do fundo, lages acima, até desabarem na varanda, por cima do lenço da cabeça, onde se escondia um rosto suado e vermelho do esforço.
Ti Angelina da Eira, Ti João da Eira. A Eira era um terraço de vistas abertas para um espaço comunitário, que todos os anos era arrematado e onde desaguava sempre o Entrudo, com os carros de bois, à porfia, a Boucinha! Mesmo ao lado do Eiró, onde nasciam todas as notícias, era na Eira que estas se sabiam primeiro que no resto do lugar.
Também aqui cabiam aqueles que, ou eles ou os seus ascendentes tinham vindo doutras aldeias, a mostrar como estes eram acolhidos, mas cuja origem se lhes colava à pele para sempre: Ti Teresa de Rouças, lugar da serra,  Ti Vila Nova, porque o homem tinha nascido do lado de lá do rio, em Vila Nova de Ponte da Barca, Ti Angelina da Várzea, Ti Maria da Várzea, Ti Rosa da Várzea, todas irmãs e cuja mãe veio da Várzea e deu os nomes às filhas. O mesmo aconteceu a outras tantas mulheres que vieram de fora, Ti Maria Gavieira, Ti Maria de Soajo, Ti Rosa de Cunhas, 
A Ti Lurdes, apesar de ser irmã da Ti Angelina da Várzea, da Ti Maria da Várzea e da Ti Rosa da Várzea, não ganhou o apelido da Várzea, sabe-se lá porquê?! Seria Várzea a mais?
Outro conjunto de nomes de pessoas transportava consigo a herança familiar. Eram os últimos representantes duma cadeia familiar e o nome continha esse património, como raízes da mesma floresta: Ti Rosa do Albino, Deolinda Fagulhas, Ti Manel da Lísia, Ti Deolinda Capela, Ti Manel do Albino, Ti Teresa do Albino, Ti Rosa Dioga, Ti Manel Garrano, Ti Manel do Xico, Ti António do Xico, Ti Rosa do Xico, Ti Manel da Luzia, Ti Maria da Tiana, Maria da Júlia, Joaquim da Júlia, Ti Rosa Gradeja, Ti Serafim Gradejo, Ti Maria do Firmino, Ti Maria Bendeira, Olívia Bendeira, Ti Maria do Abílio, Ti Maria Chaxa, Ti Gatunhas, Ti Rosa Gatunhas, Ti Maria Forneira, Ti Cacheza, Rosa da Cacheza, Ti Rosa do Cachês, Maria do Cachês, João Cachês, Ti Domingos Afonso, Ti Maria Afonsa, Tia Maria Moreira.
Normalmente os filhos recebiam o nome dos pais, mas alguns eram os pais que recolhiam o nome dos filhos: Mãe da Ti Cidade.
A Ti Ana do Correio era a única cujo nome se relacionava com a sua atividade diferenciada dos demais: ia buscar e levar o correio, a Soajo, inicialmente, e a Lindoso, mais tarde!





Manuel Rodas
Oeiras, 24 de Nov. 2014

1 comentário:

  1. Boa tarde o ti marreco, aliás João Rodrigues Belchior, e a ti Maria da calha, eram os meus avós. Cumprimentos Eduarda Martins Santos

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