I
O meu avô era alto
Por isso, via mais longe!
Um dia sonhou
que havia de pescar o nevoeiro
Na várzea do rio
E dá-lo às crianças
Para brincarem no alpendre!
Foi trabalhar
nos domingos de manhã
E fez uma escola.
A partir daí
Nunca mais ficou sozinho!
Ensinava às crianças
A pisar uvas e cuidar das cabras.
Ensinava às uvas e às cabras
A cuidar das crianças!
II
O meu avô Marujo tinha longas pernas
E mãos grandes
Que tapavam os olhos
Para não ver a serra dentro dele.
Quando as longas pernas
Ficaram cansadas
Falava com a burra branca
E iam os dois ver a serra
Que não podia esconder dentro dele.
Os filhos ofereciam-lhe palavras
de saudade e consolo.
Ele respondia : E eu que te pedi?
III
Afagava as abelhas nos cortiços.
Servia-lhes água no suor das mãos
E das pedras pisadas
Nasciam flores!
O aroma do vinho com mel
Enchia a ternura da casa.
O alquimista das flores e dos sonhos
Olhando o fundo mais fundo da lareira
Sorria e dizia aos netos: Quero essa manta toda brincada!
IV
O meu avô Marujo
Falava do Teso do Inimigo
E do Coto do Fascista
E dos refugiados da Guerra Civil.
Falava de requisições e senhas
De tempos difíceis e maus.
Contava que o regedor
Vinha requisitar o milho
Que ele escondia nos pipos da adega,
Porque o inverno tinha sempre muitas bocas.
O meu avô era republicano
Dava conselhos
Tocava bandolim e castanholas.
Às vezes afagava a sombra das árvores
E olhava longe, longe
À procura dos meus olhos de criança.
Como não sabia o que dizer, sorria!
E ele sorria também,
O meu avô Marujo!
A este Avô apenas um comentário possível: ABSOLUTAMENTE BRILHANTE.
ResponderEliminarAdorei. E abusei. Copiei para ler aos meus alunos de Escrita Criativa, no dia dedicado à Tertúlia Poética.
Por isso um grande obrigado. Um abraço.
Cecília Ribeiro disse: Primo , ao ler pareceu-me ver o nosso avô, obrigada pelo momento...
ResponderEliminarLindo, Manel. Bela homenagem. Bj
ResponderEliminarOlá Manuel. Os teus escritos também têm mel pois não se consegue despegar deles antes do fim. Abraço. Paulo.
ResponderEliminarJoaquim Enes disse:
ResponderEliminarli... gosto do teu avô/poeta/sonhador,... tiveste sorte, atrevo-me a dizer que é a tua inspiração poética... o teu avô Marujo, faz-me lembrar a minha avó materna, a Deolinda...
Vimos, por este meio, informar que o seu texto foi publicado na Escrita Criativa de Dezembro, poderá ler no link:
ResponderEliminarhttp://issuu.com/escritacriativa/docs/revista_30
Aproveitamos para agradecer a sua participação, caso tenha algum comentário sobre a Escrita Criativa de Dezembro pode comentar no Facebook, Blog ou para este email.
Sem mais assunto, despedimo-nos,
Com a máxima consideração,
Equipa Revista Escrita Criativa
ResponderEliminarLuís Filipe Lucena Ferreira
Caro Manuel
Gostei muito de ler os últimos trabalhos que me enviou, "O meu avô marujo" e "Sorrisos". Na poesia, consegue dar, de forma muito bela, a imagem do avô, que se recorda sempre com saudade, misturando habilmente os factos reais com a imaginação infantil, com momentos de, pelo menos para mim, muito boa poesia. Basta-me citar: " O meu avô Marujo tinha longas pernas/E mãos grandes, Que tapavam os olhos/Para não ver a serra dentro dele/Quando as longas pernas/Ficaram cansadas".
Transcrevo apenas esta pequena amostra mas todo o poema está cheio de bons momentos, misturando habilmente a realidade (como a recordação da Guerra Civil de Espanha, muito presente numa aldeia perto da fronteira) com a fantasia (o alquimista das flores e do sonho).
Gostei mesmo. Deve continuar, e publicar!
Parabéns pelo seu dom. Continue.
ResponderEliminarSónia D